domingo, 12 de abril de 2020

Uma montanha-russa chamada "escrever um livro"

Assim de repente, escrever um livro pode parecer uma coisa fácil. Se for apenas um hobby, se mais ninguém o ler, sim, até é fácil. O que é que interessa se tem erros gramaticais ou sintácticos? Quem é que quer saber se é semelhante a outra história já existente? Quem raio se importa se não tem lógica, se é confuso e repleto de incoerências? Se ninguém vai ler, isso é irrelevante. No one cares.
Mas, no momento em que nos apercebemos que o nosso humilde manuscrito até tem pernas para andar, preparem-se para a montanha-russa de  contentamento, dúvidas, ansiedade, insegurança... e a lista continua.

A partir do momento em que comecei a levar a minha história a sério, corrigi tudo, do início ao fim, sem misericórdia. Fiz uma correcção não só a nível gramatical e sintáctico, como também a nível do enredo, personagens, diálogos, etc. Queria que a história fizesse sentido e que não tivesse incoerências. 

Recorri a um dicionário da Língua Portuguesa online (que se tornou o site mais visitado no meu navegador), e a um dicionário de sinónimos (porque percebi que era muito repetitiva nas expressões que usava). Porque se há coisa que me irrita é ver erros em livros e escritores obcecados por uma expressão específica. Sou muito picuinhas com isso.
Sempre que queria escrever algo factual, tinha de pesquisar, pois não queria estar a inventar e induzir os leitores em erro. Um exemplo: quantos shot's de vodka são precisos para embebedar uma pessoa? (agora ficam vocês a pensar "mas que raio de livro andou esta a escrever?").

Regularmente, instalava-se em mim o receio de estar a plagiar outra obra, livro ou filme. Isso não passava de macaquinhos na minha cabeça, mas eu fartei-me de procurar livros e filmes da mesma temática da minha história, e, na verdade, dentro do tema em questão, existe muita coisa, mas nada demasiado similar.

Depois veio a insegurança. Será que a minha escrita é boa? Será que a minha história é interessante? Será que alguém a quererá ler? Será que a minha história não é apenas "mais do mesmo"? Já dizia um sábio rei da antiguidade: «De se fazerem livros não há fim.» Eu queria escrever algo original, que cativasse o leitor, que tocasse o seu coração. Sinto que coloquei grande parte de mim no que escrevi, tentando criar personagens, cenários e sentimentos realistas, com os quais os leitores se pudessem identificar. Como é óbvio, quem ler o meu futuro livro, vai encontrar clichés. Por muito que tente contrariar isso, os clichés são inevitáveis. Mas talvez seja isso que ajuda os leitores a criarem alguma ligação com as personagens e com o seu percurso durante a história. Porque, no fundo, quem é que não quer ler uma história trágica de amor? (No spoilers)

Ah, e ainda não abordei o meu maior inimigo no processo da escrita: a falta de inspiração. Imaginar a história é canja, há sete anos que tenho a história praticamente toda dentro da minha cabecinha, mas colocá-la por escrito é um autêntico suplício. É muito giro sonhar acordada, parece algo saído de um filme, digno de um Óscar, mas quando chega a hora de escrever... puff. Não sai nada. Acontecia-me constantemente ficar uma hora a olhar para o computador e escrever meia dúzia de palavras. No entanto, também tinha fases que, quando a inspiração batia forte, escrevia umas dez mil palavras de uma assentada. Admito que, como escritora, sou de extremos. Durante estes sete anos que levei a escrever o livro, estive entre dois a três sem escrever praticamente nada, enquanto neste último ano escrevi mais de metade da história. 


Mas mesmo quando escrevia muito, desengane-se quem pensa que saía tudo perfeito. Havia momentos em que escrevia e escrevia e escrevia, e no momento pensava "que obra de arte! eu sou a maior...", e no dia seguinte quando relia o que tinha escrito, percebia que era tudo um monte de tretas e reescrevia tudo de novo. Acho que mesmo depois de tudo isto e de estar completo, continuo a pensar que podia estar melhor, mas agora já é tarde.

No fim desta divagação toda, quero concluir com este pensamento: escrever é libertador. Pode não parecer, depois de tudo o que eu disse, mas acreditem em mim. Pessoalmente, a escrita ajuda-me a colocar alguma ordem nos meus pensamentos e sentimentos. E é isto.

(P.S.: Talvez da próxima vez faça um post com a sinopse do meu livro. Talvez. Não sei se estarão interessados.)

segunda-feira, 9 de março de 2020

Querem saber um segredo?

Admitam, vocês só abriram este link por causa do título, não foi? Não há como negar que é algo intrínseco no ser humano ter esta curiosidade, e por muito sensatos que sejamos, gostamos de saber o que escondem as pessoas que nos rodeiam. 
Ora bem, sob esta premissa, vou revelar-vos algo sobre a minha humilde e modesta pessoa, que poucos sabem. É um segredo devastador, que vai mudar completamente a maneira como vocês me vêem. 
Rufos de tambores, por favor... 
Vou publicar um livro (desta não estavam vocês à espera, seus abelhudos). 
Bem, eu vou explicar melhor. Preparem-se para ficarem entediados.
Desde que me conheço que tenho uma imaginação hiperactiva. Há cerca de sete anos atrás, comecei a escrever uma história que se tornou um dos desafios mais empolgantes da minha vida. Começou como um simples passatempo, pois, como sabem, eu gosto muito de escrever, mas, com o desenvolvimento da história, comecei a notar que, às tantas, até tinha algum potencial. O meu objectivo nunca foi tornar-me numa escritora de renome ou ganhar uma fortuna, mas sim dar a conhecer ao mundo esta história que tantas emoções tem despertado em mim. Infelizmente, trabalho a tempo inteiro numa profissão que nunca desejei, por isso, nos últimos tempos tenho tido muito poucas chances para me dedicar mais à minha história, e, para piorar, tenho enfrentado um writer's block (bloqueio criativo). Tive várias fases assim ao longo destes sete anos, mas posso dizer que o último ano foi bastante productivo.
Tão productivo que terminei a minha história em Janeiro deste ano. 
Antes disso, e por pura curiosidade, enviei o meu Original para várias editoras, e duas aceitaram publicá-lo. Acabei por decidir avançar com a primeira que mostrou interesse (por várias razões que não são pertinentes para o caso), e neste momento a minha obra está em fase de revisão. Não posso precisar quanto tempo vai levar, pois é uma história um pouco longa, mas isso também não me importa. 
Estou muito feliz por ter conseguido concretizar este sonho e quis partilhar convosco esta novidade. 
Nunca pensei conseguir terminar este projecto, tendo em conta a vida ocupada que tenho, mas sinto-me orgulhosa de mim própria por não ter desistido disto. 
Por enquanto, ainda não tenho novidades sobre o livro, mas quando tiver, aviso. Stay tuned. 

Com amor, 
Sara Marques 

terça-feira, 3 de março de 2020

Avó

Eu não gosto de chorar em público. Nem gosto de expor as minhas fragilidades. Tento sempre manter uma fachada alegre, optimista, à "prova de bala". Há quem me considere insensível e apática. Não sou, aliás, estou muito longe de o ser. Sou até bastante sensível, e vivi toda a minha vida a tentar evitar as lágrimas porque elas caíam com demasiada facilidade. Talvez seja por isso que hoje sou mais forte. Mas isso agora não importa.
Quero falar sobre a minha avó. A mulher que me criou e que partiu há pouco mais de um ano. Uma mulher que me ensinou como ser paciente com o marido, mesmo quando ele era um desastre como tal; como manter a alegria perante variadas situações difíceis; como ser optimista e resiliente quando a saúde física não é ideal; ensinou-me a ser bondosa num mundo frio e cruel; ensinou-me a fazer contas durante todo o ensino primário.
A minha avó sempre teve uma visão extremamente fraca, e para o fim da sua vida estava praticamente cega, mas nunca deixou que os seus olhos inúteis a limitassem. Cozinhava para mim, sempre guiada pelas suas mãos, e ainda hoje estou para saber como é que o frango guizado com esparguete ficava tão bom; limpava o chão de gatas, felizmente a casa era pequenina; arrumava a sua roupa toda por ordem e vestia-se sempre bem, mesmo sem ver as cores; era única pessoa que tinha jeito para me pentear, aproveitava eu estar distraída com a TV para passar as escova de forma delicada pelo meu cabelo emaranhado; no verão, quando eu não tinha companhia, ia comigo à praia e ficava sentada na toalha simplesmente a apreciar o calor do sol e som das ondas a rebentar na areia. 
Amava que eu lhe lesse a Bíblia e pedia-me para procurar os seus textos favoritos. Sempre gostou que lhe lesse o texto diário e estudasse a Sentinela com ela. O último texto bíblico que lhe li, antes dela perder total consciência do que a rodeava, foi Isaías 46:4, que diz: "Até à vossa velhice, eu serei o mesmo; Até os vossos cabelos ficarem brancos, continuarei a sustentar-vos. Assim como tenho feito, irei carregar-vos, sustentar-vos e salvar-vos."
Quando eu a levava a algum lugar a pé, eu irritava-me com ela porque andava muito devagar e tropeçava com facilidade. Agarrava-se com força ao meu braço para se amparar e eu acabava com o braço dormente. Hoje gostava de voltar a sair à rua com ela. Até a levaria ao colo se fosse necessário.
Apesar dos seus olhos não funcionarem, ela via o mundo com um optimismo vibrante e contagiante, e ansiava por um futuro melhor. Hoje também eu aguardo por esse futuro.
Era uma mulher que toda a gente recorda com carinho e saudade, alguém que esteve sempre presente e não se esquecia de ninguém. Conhecia as pessoas pela voz e pelas mãos. Por vezes, nem precisavam de lhe dizer nada, bastava um gesto típico e ela reconhecia-os de imediato. 
Generosa e por vezes um pouco ingénua, mas isso pouco importa, pois o seu coração era do tamanho do mundo. Tinha apenas uma filha e uma neta, mas ganhou muitos netos, netas, filhos e filhas.
Quando morreu, admito que não consegui demonstrar o que verdadeiramente sentia. Estive dois dias meio dormente, até ouvir a cerimónia fúnebre e ver os meus amigos e familiares a chorarem, e perceber o quanto a minha avó era apreciada por todos. 

Alguns dias depois do seu funeral, quando estava em casa a realizar uma tarefa banal, começou a tocar uma música que me fez pensar na minha avó... 

"I hope you know that you're my home,
but now I'm lost, so lost
I'm gonna carry your bones
I'm gonna carry them all
I'm gonna carry you home
I'm gonna bury these bones
I'm gonna write it in stone
that you were my home, my home..."
- Brighton, "Forest Fire"

Nesse momento, chorei pela minha avó. Chorei ao perceber que não voltaria a ouvir a sua voz e a sua gargalhada, a ver o seu sorriso e a sua boa disposição. Não voltaria a ouvir as suas histórias de vida, que achava aborrecidas quando era mais nova, e agora ouvi-las-ia com todo o gosto. 
Foi uma amiga à qual eu não dei o devido valor, e talvez não lhe tenha dito o quanto ela significava para mim. Tentei dar o meu melhor quando ela mais precisou, mas talvez pudesse ter feito mais. 
Já nada disto importa, pois ela não me pode ouvir, mas no futuro, hei-de compensá-la. 
Tudo isto são os pensamentos que não consigo exteriorizar, e que levei um ano a digerir. Aqui está o meu coração aberto.